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Salário pago por fora: Quais os riscos para o trabalhador?

Salário pago por fora: quais os riscos para o trabalhador? - trabalhador recebendo salário

A grande carga tributária do Brasil muitas vezes se torna motivadora de ações no mundo empresarial que, embora pareça uma boa opção a curto prazo para “desoneração” ilegal parcial de verbas tributárias, pode acarretar exponencial prejuízos futuros. Neste cenário está o salário pago por fora. 

Prática considerada comum, essas verbas não integram o salário declarado pela Empresa, diminuindo as folhas de pagamentos e os impostos que incidem sob a mesma. Como consequência, o empregado deixa de receber parte dos valores dos benefícios essenciais para a sua subsistência.

Abaixo, trataremos deste tema, com o intuito principal de mostrar os riscos e consequências desta prática.

Você sabe o que é salário pago por fora?

O famoso “salário por fora” nada mais é do que o pagamento realizado pela empresa, ao trabalhador, de valores não declarados nos contracheques, pagos mensalmente e de forma clandestina.

As empresas que ilegalmente optam pelo pagamento de valores sem integração com salário oficial, geralmente o fazem com intenção de diminuir parte dos tributos e pagamentos de benefícios, que recaem sobre os valores declarados na folha salarial. 

Na prática, há duas mais formas mais comuns:

  1. pagamento de valores “extras” em envelopes;
  2. pagamentos de valores mais altos  a título de ajuda de custo.

No primeiro caso, é o famoso envelope de dinheiro entregue ao trabalhador, sem qualquer registro oficial, geralmente em mãos, evitando-se a existência de comprovantes bancários de transferências.

A segunda ação já é comum naqueles casos em que o empregador registra todas as verbas pagas, mas paga um valor expressivo de ajuda de custo, somente com intuito de remunerar o trabalhador. 

Neste caso, a identificação do “erro” está no pagamento da ajuda de custo em valor mais elevado ao que efetivamente o empregado gasta. Nesta hipótese, é possível a identificação da diferença salarial pelo judiciário, sendo que tal diferença integra ao salário para fins de contabilização dos benefícios trabalhistas.

Importante também diferenciar remuneração de salário.

Isto porque, remuneração é o valor global recebido pelo empregado, somado o salário base fixo e as gorjetas, que porventura o trabalhador receba, enquanto que o salário é aquele base, definido pela empresa no início da contratação, sobre o qual incidirão, exclusivamente, as horas extras, adicionais noturnos, repouso semanal remunerado e aviso prévio (vide súmula 354, TST).

Neste ínterim, sobre a remuneração, ou seja, a junção salário fixo mais proventos recebidos, como gorjetas, devem incidir o recolhimento de FGTS, décimo terceiro salário e férias.

É permitido o salário pago por fora? 

Salário por fora é uma prática ilegal.

Sob o prisma constitucional (art. 7) os direitos dos trabalhadores estão assegurados, integrando em seu rol todos os benefícios considerados essenciais, como FGTS, seguro-desemprego e outros. 

A conduta de pagamento de salário por fora, de acordo com a Lei n° 8.137/1990, pode também ser considerada como crime tributário, ferindo o Direito e se consagrando como conduta ilegal.

Considerando as vedações legais, é ilegal o pagamento de qualquer valor por fora, não declarado ou, ainda que declarado, pagos como ajuda de custo de forma equivocada, com propósito de remunerá-lo.

Por que o salário é pago por fora em alguns casos?

Algumas empresas que utilizam essa prática têm como objetivo diminuir os tributos que incidem sob a folha de pagamento e, com objetivo claro de reduzi-la, já que, há benefícios que incidem sobre a remuneração completa do funcionário, como FGTS, férias e décimo terceiro.

Por outro lado, o empregado, muitas vezes, se sente subordinado à aceitação da proposta em razão da necessidade de garantir uma vaga de emprego e aumentar seus proventos para subsistência própria e de sua família.

A título exemplificativo, temos um empregado que recebe R$ 4.000,00 de remuneração total no contracheque, acrescido do valor de R$ 2.000,00, pagos por fora. Neste caso, em uma conta superficial para fins pedagógicos, o FGTS no percentual de 8% incidirá tão somente sobre a remuneração recebida no contracheque (R$ 4.000,00) e não na remuneração total recebida (R$ 6.000,00). 

Desta forma, o trabalhar restará prejudicado, uma vez que o empregador recolherá valor a menor a título de FGTS, diminuindo, a priori, sua carga tributária.

Quais as consequências do salário pago por fora para o trabalhador?

O empregado terá todos os benefícios do INSS, bem como sua aposentadoria, cálculos com base no salário declarado nos contracheques, já que os salários pagos por fora não integram a base de qualquer benefício previdenciário.

Quais direitos trabalhistas o empregado deixa de receber?

Os benefícios principais que são exponencialmente reduzidos seu desfavor do empregado, são:

  1. férias;
  2. FGTS;
  3. décimo terceiro salário;
  4. seguro desemprego;
  5. horas extras;
  6. INSS.

O valor das férias, que incidem sobre a remuneração, é claramente reduzido, gerando recebimento a menor, do que efetivamente deveria o empregado receber.

O FGTS, como é recolhido sobre uma remuneração inferior à realidade, também é altamente prejudicado, computando-se nele valor inferior ao de fato devido.

O décimo terceiro também. Este benefício, pago em até duas parcelas anuais, geralmente novembro e dezembro, até dia 20/12, tem o objetivo de entregar um salário a mais ao empregado. Se o salário tem partes extras oficiais, o décimo terceiro vai integrar o contracheque apenas no valor declarado, não havendo assim, a efetivação do objetivo primordial do benefício.

Neste aspecto,  pode ainda ser mais danoso, quando o empregado necessita de um seguro desemprego. O cálculo do benefício é feito mediante salário oficial declarado, que é utilizado como base para pagamentos das verbas trabalhistas e tributárias. A redução de valor salarial oficial, por óbvio, gerará percepção a menor do benefício.

As horas extras também integram a lista de desvantagens. Se o valor que deve ser considerado salário base é manipulado em razão da repartição  ilegal, o percentual a ser calculado de hora extra também será menor, entregando valor muito menor do que aquele que teria o empregado direito, deixando assim muitas horas para trás.

É possível ainda que o recolhimento de INSS seja impactado. Isto porque, além dos valores de contribuição menores, o cômputo da verba de aposentadoria considera em regra a média de 100% dos salários de contribuição, o que gerará fator de resultado exponencialmente reduzido.

São flagrantes assim as consequências negativas para o trabalhador.

Para a empresa, quais as consequências do salário pago por fora?

Ainda que a prática pareça vantajosa, pela redução de valores de verbas e tributos no mês a mês da empresa, que já é abusivamente sobrecarregada de impostos, a longo prazo pode causar prejuízos desastrosos, podendo esse empregador ser submetido à 02 (duas) punições:

  1. Ações judiciais trabalhistas do seu corpo de empregados;
  2. Ações oriundas das fiscalizações de órgãos públicos de controle.

Empresas de pequeno, médio ou grande porte podem ser submetidas à uma ação efetiva de um órgão público que atue na seara trabalhista como o Ministério do Trabalho e Previdência e o Ministério Público do Trabalho. Para tanto, uma denúncia, ainda que anônima, é suficiente para que essa visita aconteça. 

As fiscalizações funcionam como verdadeiras auditorias, com objetivo simples: descobrir as práticas ilegais trabalhistas, sobretudo as informalidades do mercado de trabalho, em prol do cumprimento efetivo das Leis. 

Após a apuração, identificada a irregularidade, o Ministério do trabalho pode lavrar o auto de infração, oriundo de um Processo administrativo, com consequente imposição de multa que deve ser adimplida, sob pena de inscrição da empresa na dívida ativa, podendo gerar futura execução fiscal contra a mesma, onerando ainda mais o valor devido.

Ainda é possível que, o empregado que é subordinado ao salário por fora, no insucesso das tentativas de solução do conflito diretamente com o empregador, judicialize a causa, entrando com ação perante a Justiça do Trabalho, até 02 (dois) anos após o rompimento do vínculo empregatício, ou no curso da atividade laboral, para requerer as diferenças não pagas pelo período de 05 anos que antecederam à data da demissão (ou do pedido).

Assim, ficará obrigado o empregador a arcar com todas as diferenças não pagas, desde os recolhimentos de INSS que deverão ser complementados, até os valores de férias, horas extras, décimos terceiros e outros, pagos ao empregado, que ainda será indenizado pela conduta ilegal trabalhista, ou seja, o que poderia ser diluído mensalmente, agora será pago, sob um montante de complementações, acrescido de juros de mora e multa, onerando exponencialmente à empresa. 

Assim, a conduta, sob qualquer hipótese, não vale a pena.

Salário pago por fora sem o consentimento do trabalhador

O salário pago por fora, em sua grande maioria, é alinhado no momento da contratação, com o empregado, que por motivos diversos, aceita a proposta do Empregador.

Nos casos em que o trabalhador não aceita a proposta, mas o empregador insiste em efetivar os valores por fora, não havendo êxito na tentativa de acordo, deve o mesmo entrar com ação para decisão da lide.

A Empresa fica obrigada a ressarcir todos os valores não pagos, incidindo neste caso multa e correção monetária.

Neste aspecto, o art. 467 da Consolidação das leis Trabalhistas (CLT) prevê que, em caso de rescisão, havendo o trabalhador discordado das verbas rescisórias, a empresa que não corrigi-las, comparecendo à justiça do Trabalho, havendo comprovação do erro, deverá suportar o pagamento, além do que é devido de complementação dessas verbas pagas a menor, a título de  multa no montante de 50% dessas verbas.

Com efeito, o trabalhador que não concordar com as verbas incompletas, no momento da rescisão do contrato trabalhista, deve se opor ao empregador, demonstrando o descontento para a complementação dos valores devidos.

Como comprovar o salário pago por fora?

O salário pago por fora, antigamente, quando não havia tanto acesso às tecnologias, era difícil de ser comprovado. Como o valor era pago pessoalmente, em mãos, sem deixar rastros ou quaisquer comprovações oficiais, havendo, no máximo, apenas testemunhas que presenciaram a conduta, a sua comprovação era precária, e, muitas vezes, o trabalhador não conseguia êxito.

Atualmente, o acesso à dispositivos celulares, computadores, tablets e demais dispositivos móveis permite formar de maneira mais contundente e inquestionável um conjunto probatório que pode munir o empregado contra o empregador, na ocasião de uma ação judicial, ou até mesmo, num acordo trabalhista extrajudicial.

Assim, um simples áudio enviado pelo empregador, mensagens ou uma gravação de vídeo autorizada podem externalizar o indício da fraude para, posteriormente, garantir a comprovação do ilícito e a consequente correção de todos os valores imputados ao Empregador.

O ideal é que o empregado guarde qualquer comprovante possível desse pagamento, qualquer documento que possa comprovar a atitude do empregador, como seus extratos, bem como, se possível, em conjunto, receber na presença de mais uma testemunha, para possibilitar a prova futura, guardando inclusive todas as datas destes recebimentos.

Importância de um advogado especialista para o caso

O advogado especialista assume posição estratégica e fundamental para a análise de cada caso e a tomada de decisões para a correção dos problemas advindos da conduta ilegal, tanto por parte do trabalhador, como empregador.

O empregado que se sentir prejudicado deve buscar ajuda de um profissional capacitado que, munido dos documentos necessários, o instruirá sobre os próximos passos, desde a instrução para obtenção de provas necessárias para judicializar a causa, como, a avaliação de todas as verbas e benefícios deixados para trás, para indenizar o trabalhador prejudicado.

O especialista ainda será responsável por categorizar essas verbas, entender o que se trata de remuneração e salário, e quais benefícios que deveriam incidir sobre cada um, bem como, a imputação do montante total a ser atualizado na justiça, responsável assim pela estratégia para convencimento do magistrado na causa.

É condição essencial que o especialista profissional avalie cada caso, cada documento e oriente ambos, empregado e empregador a regularizar as práticas ilegais.

No tocante à Empresa, o ideal é o reconhecimento das práticas e a correção desde já, integrando na folha oficial todos os valores pagos, evitando-se assim maiores prejuízos futuros.

O que aparentemente parece ser uma boa estratégia para diminuir tributação e gastos mensais, pode ser na verdade uma grande armadilha que onerará sobremaneira, com valores exponenciais, a própria empresa e o empregado, o grande prejudicado pela prática ilegal do salário por fora.

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Caso ainda tenha alguma dúvida, entre em contato com um advogado de sua confiança. Ele dará todo o direcionamento que você precisa para melhor resolução do seu caso. 

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